segunda-feira, junho 30

Engate.

Ouve-se a Shine a Light de Spiritualized...

Olha sem expressão desde a parede onde se encosta para a outra parede que fica do lado oposto da rua. Tem cabelo muito curto e escuro. Um copo na mão e um sorriso de pessoa perdida entre demências e seres que a influenciaram de maneiras caleidoscópicas. Sabe lá ela para que aqui está, sabe lá ela justificar as suas preferências, as suas rejeições, escolhas, indecisões. Tem jeito com as mãos e continua com o sorriso belo mas doente.

Encosto-me a seu lado e...

«Se tudo isto não fosse um idiota jogo de aparências e houvesse lugar para o conteúdo, tentava engatar-te de forma súbtil, utilizando o intelecto e uma ou outra posição que me favorecessem os ossos da bacia, mas, sei como as coisas funcionam, não vale a pena. Vou apenas ficar aqui encostado nesta parede, ao teu lado, aceitando o teu desprezo e aguardando que discretamente te afastes de mim. Espero ao menos, que a 5 ou 6 metros de distância, olhes para trás, não resistindo à tentação de ver nem que por alto, as feições do tipo que agora, com esta voz entediada, se dirige a ti.»

Afasta-se lentamente, não olha para trás. Cedo começo a dirigir-me para o lado oposto, sem me voltar, para poder pensar que talvez, ali mais à frente, na esquina, ela tenha olhado por cima do ombro e trocado todo o vazio que ostentava por um ar de séria desilusão.

quinta-feira, junho 26

ET

O meu carro, apesar da bateria nova, já não é o mesmo de outrora; já não é aquele meu complemento, já não somos uma entidade biónica. Muitos de vós que aqui lêem este texto, já tiveram o prazer ou o desprazer de viajar na minha viatura de há muito tempo, ouvir prosápia, pisar os grãos de areia e materias estranhos que se acumulam no chão por entre papeis de tudo, algumas inclusive, tiveram initimidades naqueles estofos esverdeados e conspurcados pela ausência de limpeza que para mim é um ditame quase filosófico.
Escapa-me nas curvas, trepida bastante quando passo os 90km/h, já não consigo disfarçar os ruidos parasitas com a música que sai por umas colunas velhas ligadas a um rádio antigo e contrafeito. Custa-me as respostas lentas e demoradas, as saidas da inércia com birras e jeitos de quem quer fingir ter alguma pesonalidade.
De qualquer forma, não me consigo desfazer dele e tenho a dúvida constante se de facto será melhor para mim trocá-lo por outro, se de facto me quero livrar dele ou não.
Concluo apenas que o meu carro é a mesma coisa que as minhas relações.

Promoções

É tudo auto-promoção! Pare-se de criticar as tipas que fazem o apanágio das mamas via virtual. Sim caralho, essas tuas fotos de perfil rebuscado e a preto e branco, também são auto-promoção, que têm exactamente o mesmo intuito das dos decotes ousados e dos músculos besuntados pela própria iliteracia.

terça-feira, junho 24

Tatuagens

Sempre gostei de tatuagens. Desde miúdo que quero ter tatuagens. Para amenizar esse meu desejo, punha daquelas tatuagens temporárias das Tartarugas Ninja que vinham no Bollycao. Recentemente, com um programa da televisão por cabo (Miami Ink), a minha antiga paixão por tatuagens reacendeu-se.

Após este reacendimento, tentei descobrir que símbolo poderia tatuar definitivamente na minha pele. Após muito pensar, muitas horas de pesquisa interior e na internet, não consegui chegar a um símbolo que significasse algo de relevante para mim. Depois da busca por um símbolo ter sido um fracasso, pensei numa frase ou nome. Seria estúpido por o nome da minha namorada, que apesar de gostar muito dela, sei que as relações não duram para sempre, ou pelo menos a maioria. As relações são um gato de Schroedinger que, quando se abre a caixa para ver se o gato está morto ou vivo, a radiação se espalha e mata tudo à volta. Por isso, como não se sabe se o gato está vivo ou morto (ou seja, se a relação resulta ou não) não convém tatuar o nome do/a namorado/a.

Sendo assim, pensei em algo mais permanente. Os pais. Tatuar o nome dos pais seria uma boa opção, e como não há dúvidas de que sou filho de ambos os meus progenitores, mais forte seria essa hipótese. No entanto, tatuar o nome dos pais pode parecer um pouco mimado e infantil. Só que não é esse contra que me deixa apreensivo. É o facto de, se puser o nome dos meus pais, tenho de por o da minha avó. De facto, não é minha avó. É madrasta da minha mãe. Mas tratou-me como se de um filho se tratasse. Por isso, devia tatuar também o nome dela. Tatuando o nome da minha avó, tinha de ponderar se também tatuava o do meu irmão e o da minha sobrinha. Como estes últimos formam um núcleo familiar por si só, pareceria mal se toda a família não fosse englobada. Assim, teria de por o nome da minha cunhada também. Para por o nome da minha cunhada, este teria de ser acompanhado pelo nome dos pais dela. Se pusesse o nome dos pais da minha cunhada, teria de por o nome de dois primos meus, que foram criados comigo na minha avó, sendo por isso quase meus irmãos. Para por o nome deles, teria de por do meu tio e da minha tia. Mas como a minha mãe tem 4 irmãos e o meu pai três, tinha de por o nome deles também, das/os respectivas/os mulheres/maridos (que nalguns casos são dois ou três), o nome dos meus primos, que entretanto a maior parte deles já casou e tem filhos. Resumindo: a minha tatuagem ideal seria uma árvore genealógica. Conclusão: desisti de fazer uma tatuagem. Provavelmente, farei uma apenas quando todos morrerem e eu for o único da minha família. Assim é mais fácil, tatuo o meu nome. Porque é que o Charles Manson não é português e assassina a minha família? Hã? Facilitava a minha decisão de fazer uma tatuagem, já para não falar do facto de que a faria ainda jovem e radioso, quando as tatuagens são bem aceites e não apenas memórias de uma juventude de loucura ou de uma crise de meia-idade.

Bizarrus

http://katypaixao.hi5.com/friend/photos/displayUserAlbums.do?ownerId=108489556 ver o álbum "my grandmother" e "o funeral da minha avozinha"; reparar nas legendas. São estas coisas que me dão aquela pequena vontade de viver.

terça-feira, junho 17

sábado, junho 14

sexta-feira, junho 13

"dig, we'd like to get something straight"

está bem. eu só quero deixar aqui uma nota glicodoce para todos nós porque acho que já vai sendo tempo. Portanto, o que eu queria apresentar era uma espécie de reclamação ao texto que está por debaixo deste. Esta reclamação vem no sentido de, como todos aqueles que me conhecem razoavelmente já sabem, eu andar a ver sempre se bufo nuvens e sombras negras para outro lado. Não posso fazer nada, acho que deve ser por ter ido muitas vezes à noite, de lanterna e impermeável e umas botas muita boas que tinha,  a Sintra quando ainda era mais adolescente. Apanhávamos o comboio e lá íamos. Não sei porquê mas, naquela altura, ou não havia tanta gandulagem ou então não tinham guito para os bilhetes. Acontece que, na altura, as coisas ainda eram todas em escudos, só passados dois ou três anos é que começou a haver dupla classificação de quanto custava um bilhete. De qualquer maneira não havia muita gente em sintra, à noite, naqueles tempos. Acho que deve ter havido um pico em termos de rituais e tal em meados dos anos noventa, e como nós começámos a ir lá em 2000 ou coisa parecida, nunca vimos ninguém. Havia muitos e bons sítios para fazer amor, mas nós nunca o fizemos. De qualquer maneira, o que importa dizer aqui é o seguinte: concordo com a ideia de que a partir de certa idade estamos todos fodidos; ando a vivê-la. Mas também acho que há uma idade, se as coisas correrem bem, a partir da qual nos desfodemos. Pelo menos o meu avô era assim.

quarta-feira, junho 11

Vulgar

A partir de uma certa idade, só conhecemos pessoas completamente fodidas por dentro. Desilusões amorosas, gente que morreu, úlceras, rejeições em cadeia, frustrações, alternativas forçadas, equívocos sexuais, refugos tolerados e até consumidos. Eu sou uma delas. Inevitavelmente, somos comparados, temidos, medidos, alterados; tudo porque já houve um que fez algo bom que nós também devemos ser hábeis para fazer, ou algo mau que nós não podemos dar a entender, seja lá de que maneira for, que possamos vir a fazer.
Cheira bem aqui dentro, provavelmente devido ao lento queimar do incenso, ou quem sabe, por causa da minha íntima proximidade de uma estranha, que além de me atiçar a curiosidade e a libido, impede que solte flatos. Está calor e sinto-me imediatamente constrangido devido ao facto de saber que suo com muita facilidade, talvez seja esse pensamento que me faz efectivamente suar. Toca uma música agradável e eu mostro-lhe umas porcarias que escrevi no outro dia, numa das muitas horas mortas do trabalho em que aproveito para produzir debilidades várias que assim impedem a infertilidade total. Ela comove-se, repete por várias vezes o quão bom aquilo está, quanto se identifica e não sei quê. Provavelmente o texto de umas trinta e tal linhas, recorda-lhe um tipo qualquer que a deixou, cujo sentimento que outrora florescia unilateralmente, ainda ali está presente e me separa dela de forma muito subtil.
Passam-se semanas e muitas foram as vezes que pensei deixar-te, hoje, vim decidido a acabar com tudo, com este rol de mentiras, com o atrevimento que tenho ao decidir prolongar algo condenado ao insucesso, apenas e só, por medo de qualquer coisa, não creio que seja medo de ficar só ou de não foder, não, é medo por ti, medo pela tua reacção, pelas tretas que me irás atirar à cara, pelas lágrimas que terei de te ver verter, pelo ridículo fungar que terei de escutar, foda-se, por tudo isso me fazer sentir mal para caralho. Mas hoje será diferente, hoje tudo findará, custe o custar, já antes o fiz, já mo fizeram antes, sei que suportarei e a vida, aziaga e medíocre, continuará como nunca antes continuou, mas igual àquele sempre finito que no fundo, é tão a nossa existência.
Chego ao pé de ti, que vestes um vestido castanho e tens o cabelo solto, com uma franja que quase te tapa a vista; soltas um dos teus sorrisos que revelam uma depressão mal resolvida e toda uma dependência pelo meu ser, tocas-me de forma leve e a tua pele é mesmo macia. Estás bonita demais para eu te deixar, terá de ficar para outro dia.

terça-feira, junho 10

A pluvia ruminação

Ultimamente, sempre que visiono um ente do sexo oposto a chorar - naquela altura em que mostram toda a fragilidade, a sua racionalidade emocional e me reconheço no bolsar daquela sua miséria inerente ao passar dos seus alegres dias - sinto uma ligeira erecção.

segunda-feira, junho 9

As Palavras de que Gosto

Rodovalho.

quarta-feira, junho 4

(Hetero-)Retrato

"Pedro está sozinho na sorumbática plataforma, com uma postura que revela uma melancólica acessibilidade espera o metro que acaba sempre por vir. Lúcia desce as escadas, passo a passo, desvanece-se no cinzento da própria vida, flutua no conforto de mentir a si própria, de se convencer que já não acredita. Ignora a musak e repara no rapaz, mas finge que ele não existe, contudo, pensa nele, e não pensa de uma forma casual, apesar do forjado ar de casualidade. Senta-se à sua beira. Ambos fixam o outro lado da deserta e estéril galeria, nunca se olham, não volvem um para o outro, mas… as mãos… as mãos, levadas por um impulso preenchido por humana necessidade, flutuam sobre os jeans, ultrapassam o atrito como aviões a penetrar as outrora intocáveis nuvens e… unem-se suavemente, um toque ligeiro, um entrelaçar de dedos.

Vão para casa, percorrem a calçada iluminados pelas ejaculações luminosas de candeeiros de uma romântica sinistralidade. Paz, harmonia, tristeza partilhada que se transforma em algo confortável e apaziguador.

Pedro, o teu olhar… A Lúcia não o viu…

Lúcia, o teu olhar… O Pedro não o viu…

Cobardes, cobardes, cobardes.

Uma noite solitária no albergue, uma daquelas luas partilhada por ambos, carregada de um peso metafísico que deixa nas suas celestes entrelinhas, perceber-se uma insatisfação ignorante e displicente. Um olhar, prolongado nos segundos da dolorosa sensação de reentrada na realidade, uma certeza… não valeu a pena.

Partiu e não ficou. Se ele ficasse, um dia partirias tu, até podias para sempre ficar, mas já lá não estarias."

Citando as palavras de Nada.