domingo, agosto 16

S.

Nada vai mudar. De Agosto a Fevereiro será como foi de Fevereiro a Agosto. Distância. Mas distância sem insípidas simulações de aproximação.
Mas as ruas estreitas e as calçadas espirituosas que percorrerei não mais serão as mesmas, sabendo eu de antemão que por ali não andarás, que por ali não deambularás com esse teu ar de pessoa com brilho e que encanta sem pretensão. Agora terei a certeza, quando sair num dia em que ameaça chover, que não te encontrarei distraída a dobrar uma esquina dentro do teu casaco preferido, no metro a olhar um indigente pelo vidro, a afagar um cão pulguento que por estar esfomeado se dá a muitos afectos, nem tampouco te verei a levar a bicicleta pela mão por não teres aguentado a subida.
Oiço a música que não é tua mas que me deste a conhecer e vejo já as folhas a caírem dos carvalhos, das bétulas e dos pinheiros, aí nessas ruas geladas que percorres com um sincero sorriso nos lábios e pensas no que te custará vir embora, no que te custará voltar a isto, a esta pangeia humanóide que tão pouco te dá e tão pouco se vangloria com os teus passinhos ligeiros por cima dela. Vai-te custar a regressar àquelas conversas velhotas com um entendimento mútuo que nos aproxima ao mesmo tempo que nos afasta.
Vou escrever-te e contar-te, por meias palavras e com sentimentos contidos, tudo o que é trivialidade nesta cidade, talvez ponha um bocado de luz nas epístolas, antropomorfizações, mas nada de referir a falta que me fazes, pois nunca te tive, nada de referir o quanto te gosto, pois não te quero incomodar, não quero ser o teu Lévin...
S. Irei à cinemateca e em todas as telas ver-te-ei; ficarei sentado sozinho lá atrás, como de costume e não olharei para a porta cá de cima por onde entram as pessoas que vêm atrasadas e não tentarei discerni-las no escuro, porque agora, saberei que não és tu, saberei que estás nas tais ruas, cheias de folhas secas ou cobertas pelos primeiros nevões do ano, ligeira, marcarás teus pés nos corpúsculos frios e alados que tingem tudo de branco, tudo de branco, e os meus olhos, já não serão tingidos pelo vermelho das tuas letras empáticas e compreensivas, pelo teu carinho que não partilha desgraças nem dores.
Fico mesmo feliz por ti, pelo teu olhar que ganhará um novo fôlego, pelo teu bom-senso que continuará a levar-te pelos bons caminhos, para longe de mim...

1 comentário:

Chigurh disse...

Red House Painters - Grace Cathedral Park.