terça-feira, dezembro 30

O Natal é lindo

Nas ruas, os indigentes em manada, saem do ócio e, munidos de cadernos que têm uma espécie de tísica de papelaria, dão o seu melhor no que às palavras melosas concerne, esmeram-se na arte de persuadir com mentiras e com o facto das pessoas nunca saberem se eles estão ou não, artilhados com uma seringa com o HIV ou com um tétano tuberculoso. É a única altura do ano em que o pedir vale mais a pena que o roubar, há que aproveitar e o indigente experiente sabe-o bem, tem a perfeita noção que o Natal é o seu solstício de Verão. Incrível reparar num deles quando ainda há luz solar; são magníficos na sua agilidade, soturnos mesmo com o sol a bater nas suas anacrónicas vestes, esplêndidos no cruzar as movimentadas ruas e a abalroar pessoas com a sua muito pesada presença, claro que têm os dentes danificados por hábitos auto-destrutivos e pela merda dos enlatados, um olhar inexpressivo e vazio e a cara tão esburacada como uma estrada em Beirute, mas lavaram o cabelo e com o pente castanho que desde a década de oitenta guardam no bolso traseiro das calças, puxaram aquela cabeleira cinzenta, (não tem nada a ver com grisalho, cinza, como se fosse o pelo de um rato) espessa, oleosa e com caspa de tamanho mutante, para trás – porque raio todos os indigentes quando se penteiam usam o mesmo penteado? Os temas do peditório dividem-se em três grandes grupos: Sida, toxicodependência e criancinhas, ou seja, a tríade da desgraça. Os pedintes habituais, aqueles mal-educados e mais passivos, com um poiso fixo junto ao metro ou numa esquina movimentada, desaparecem, como que os pedintes sazonais os exterminassem, só que tal não acontece, visto em Janeiro lá voltarem eles com os seus membros mutilados, seus carcinomas e necessidades de consumista dignidade.
Dou uma moeda a um depois de ele me prometer que aquilo seria para a droga, tabaco ou uma quase impossível bebedeira, nunca para uma instituição.

domingo, dezembro 21

Condicionamento?

Para a indiferença de um velho e pesado eléctrico que há anos percorre os carris impostos à terra e ao basalto, um grupo de miúdos naturalmente travesso, resultante de uma educação peculiar e de um meio particular onde a domesticação é apenas parcial e a idiotice e a consanguinidade muito frequentes, vão, ao mesmo tempo que troçam uns dos outros, escarrando para as pessoas que transitam na rua e civilizadamente se desviam para que o eléctrico possa passar e levar os seus ocupantes a tempo e horas para o seu destino que tantas vezes nem existe. Têm uma penugem que está para a barba como a mórula está para o embrião, um sebo natural que lhes atribui uma tez escura, magros, claro que são magros, alimentam-se mal durante os intervalos das discussões dos pais envoltos em imbróglios na Mouraria, Alfama, num qualquer desses bairros onde existem os verdadeiros e apenas parcialmente domesticados lisboetas; tomam tragédias desconexas no lugar do pequeno-almoço, guerras sobre parentescos dos vizinhos e primos em França ao almoço e ao jantar, para além da penicilina, grandes doses de contenciosas heranças e partilhas intrujadas. Claro que eu agora podia dizer que me sentia açambarcado por toda esta áurea citadina, pela melancólica química dos espaços exíguos por onde a composição passa, pelos olhares argutos e natural mau aspecto dos que vão à pendura, pelas conversas sem sentido das velhotas assombradas pelo espectro do senhor Senil, pela subtil e paciente labuta dos carteiristas que eu não vejo, podia escrever sobre as Tágides, porque o raio da palavra soa mesmo bem. Podia escrever qualquer coisa acerca de Fernando Pessoa, que é sempre aceitável nestas situações e na pior das hipóteses, é uma boa deixa de engate para uma daquelas tipas pretensiosas que se fartaram das discotecas e da música quadrada e agora procuram cultura e profundidade, mas, escrevo apenas acerca do júbilo da chusma fedorenta e feromónica; uma efusão imparável faz-se sentir no eléctrico quando um deles – um dos mais calados por sinal – acerta com uma enorme escarradela na testa desprotegida de um tipo careca e de meia-idade – talvez não fosse um dos mais calados e o silêncio fosse apenas um sucedâneo da colheita e respectivo armazenamento do seu belicoso composto de suco gástrico com saliva – o homem fica atónito e passados uns dois segundos, ao ver os risos e os dedos a apontar, apercebe-se do sucedido, encolerizado, ameaça de forma pouco articulada, o eléctrico pára num semáforo uns metros acima: «ai ai, o careca vem ai, ele vem ai» mas claro que não foi. Continuo a observar aquele desagradável grupo de recém púberes sem qualquer expectativa, eles continuam a apontar as suas escarras quase indiscriminadamente e desmancham-se em gargalhadas quando acertam, quando falham, conjecturam de forma pouco elaborada e insípida os motivos do falhanço «não vês que o vento está para o outro lado»; «para ai é a descer». Não sei se fico fascinado ou atordoado com a sua falta de moral, escarram para crianças que vão de mão dada com a mãe, para carrinhos de bebé, para senhoras grávidas, velhotas amparadas por uma bengala, tipos com ar de quem vai para o cadafalso, gajas podres de boas com aqueles óculos escuros grandes que tapam a cara quase toda – admito que no caso das últimas, enfim, não é preciso dizer mais nada. A dada altura, um deles depois de acertar num alvo desejado, agarra-se a um pedaço de madeira e espeta-se uma lasca na sua mão – será que achou que foi punição? O que sei é que esse não escarrou mais. Animais, condicionamento clássico?

sexta-feira, dezembro 19

coração partido

quarta-feira, dezembro 17

Amor?!

Quando uma tipa que trabalha numa megastore da adidas no freeport e que por sinal é muito antipática e bem parecida, acaba com um tipo qualquer, ele não consegue evitar telefonemas consecutivos, mails, aparições à porta do prédio nos arrabaldes do Montijo, onde ela habita com uma mãe senil e um pai demasiado irascível. Ele insiste, ele quer saber porquê, quer saber o que causou tal decisão da parte daquela rapariga de cabelos lisos castanhos e olhos esverdeados e arrogantes; pergunta se aquele dia na praia, de noite, já nada significa, se aquelas horas que antecederam o primeiro beijo, já estão esquecidas, o que será dele, pergunta ainda. Claro que não obtem resposta, continua na ignorância idiota, na descrença que o contexto se altera. Passado algum tempo, levados pelo desespero, ele quer negociar e como o negócio parece vantajoso para a rapariga, ela acede às negociações. «Só te pergunto mais uma coisa, apenas uma pergunta, respondes e eu nunca mais te chateio...» ; «tudo bem, eu respondo e tu segues a tua vida» (que coisa idiota, seguir a vida, como se a vida parasse, o tempo estagnasse e os dias não se sucedessem naquele néscio fatalismo).
- Ele é melhor que eu na cama? Ela nega-se a responder, então, revoltado e a sentir-se ultrajado pela quebra da promessa, ainda apruma a questão, pergunta mesmo aquilo que quer saber, o que o move, o que o faz desesperar... - Tem a pila maior que eu, é?
E pronto, é isto que preocupa as pessoas, o tamanho da pila. Não querem saber se a pessoa que supostamente amam, vai ficar bem, se irá ser feliz etc etc etc. Quer é saber quem tem a pila maior. Amor? Lá existe amor...

segunda-feira, dezembro 15

Só porque sim...

E porque o Rei Juliano, no filme "Madagáscar 2", canta esta música quando apanha uma bebedeira aquando da chegada a África. Foi o pormenor mais genial de toda a história dos filmes de animação. Um lémure bêbedo a cantar o "Private Dancer" da Tina Turner...

domingo, dezembro 14

lazy bones.

quero introduzir aqui a noção, que me ocorreu há pouco em conversa, de rabo subjectivo. O que é um rabo subjectivo? ora bem, passo a explicar de forma muito sucinta: um rabo subjectivo é precisamente aquela bunda a qual num dia parece que é muita boa, que lhe foi puxado o lustro, mercê das rubicundas e apetecíveis formas nalgais e noutro dia deus nos livre o que aconteceu à obra de arte, terá sido roubada? o rabo subjectivo depende frequente e inevitavelmente do tipo de calças que a rapariga está usando no dia em que a análise é feita. O rabo existe e chama a atenção uns dias e noutros, cadê?
com isto quero dizer que nós, homens, estamos a ser, sempre fomos, e provavelmente sempre seremos, enganados. merda.

quarta-feira, dezembro 10

Cor do céu

Caríssimos colaboradores e visitantes deste excelso blog, Eu, Homem da Fruta, ou Tio Frutinhas, como preferirem, venho por este meio justificar a mudança de cor dos links do nosso tão querido e amado blog Muitos se perguntarão "Mas, Tio Frutinhas, porque mudar de um tom de vermelho, tão aparentado com o tom de sangue bovino, a espichar de pescoços de vacas que são mortas segundo rituais ancestrais, com uma facada na artéria jugular, para um azul tão paneleiro que se parece com a cor do céu?" Ah, meus caros companheiros, amigos, leitores, peregrinos, fornecedores e bandalhos... Eu tenho a resposta. Foi uma merda de um problema qualquer que a puta do blogger tem, que muda a merda da cor da letra dos links para azul! AZUL! É que nem sequer faz parte das cores disponíveis! Por isto, meus caros, deixamos de ter um blog tão fantástico para termos de nos contentar com um blog relativamente fantástico. Blogger, nunca te perdoarei... Ficarei com esta mágoa sempiterna no meu coração.

terça-feira, dezembro 2

A noite (in)feliz

«Entrei numa casa trivial, casa de raparigas solteiras que haviam organizado as coisas, a proxémica, os víveres, a luz, de forma a darem uma aparentemente modesta mas que na realidade era uma pretensiosa festa; para mim, era mais que uma festa, era um baile de debute intelectual. Abriste-me a porta, formosa, de seios petulantes e com um penteado cheio de estilo que ficava bem com o teu embotado e ao mesmo tempo, perverso olhar – vi-me em ti. Sigo-te enquanto cirandas pela casa e me apresentas ao teu rabo proporcional e às pessoas que por lá estão com o seu à vontade e ar pedante; vou recusando as ofertas de alimento mas até me apetece comer, recuso nem sei bem porque e invento rocambolescas justificações para a recusa que só podem mesmo parecer rudes ou no mínimo, idiotas; talvez eu não queira comer porque não confio nas minhas maneiras no trato com os alimentos e talheres ,porque desconfio que pareço uma besta a deglutir, um abrutalhado devorador de carne, coisa que ali não existe, ali ninguém come carne, ali estão todos num nível moral acima do meu.

Parece que toda a gente se conhece e eu, não conheço ninguém. Ela, a que me abriu a porta, olha-me de soslaio e parece abstrair-se da conversa e dos outros, embora, quando a referem, sorria com pelo menos metade da boca. As conversas à lareira mal ateada que solta grandes quantidades de fumo directamente para sala e ao som de dvds musicais, correm-me bem, fala-se de economia, sociologia, política, merdas afins, e como que por milagre ou por uma estranha verve que calhou surgir naquele dia, tudo o que eu digo parece acertado, até consigo introduzir estrangeirismos de forma assertiva, algo inédito até então, tudo aquilo que os outros referem é por mim conhecido, faço acrescentos, apartes, referências caleidoscópicas, ouvem-me, invejam-me, tentam refutar-me delicadamente mas eu ainda mais delicadamente, faço-lhes ver a minha razão e acabam por aceitá-la, consumi-la com um delicado travo a desagrado. Ela, de vestido cinzento, foi ficando mais silenciosa e também voluptuosa ao longo da noite. Chega a hora das despedidas: tal como os outros fazem, revelo a intenção de partir; despeço-me de um, de outro, dou dois beijos numa qualquer, ela fixa-me, olha-me com um olhar triste, de animalzinho abandonado, de criança órfã que vai contorcendo os músculos da face para arranjar entre as rugas caducas geradas pela vida, mais uma fresta onde guardar nova desilusão. Será que quer que eu fique? Vou retardando a minha saída o mais que posso, ela nada me diz, até que: Não recebeste uma mensagem no telemóvel? Consulto-o e tenho duas, a primeira pergunta se já vou, a segunda, num clamor de desespero ou confiança, pede para eu ficar. Fiquei…»

quinta-feira, novembro 20

Chroma Key.

1- estava a entrar no metro da baixa chiado quando ouvi um senhor que anunciava a venda de pilhas, 16 a 1€, para o rádio, mas mais surpreendentemente, para o leitor de mp3. Que voltas deu a vida deste homem (do qual pareço lembrar-me desde que sou puto [se não este, talvez fosse outro, de semelhante tez tisnada, olhos azuis. quem será a mãe deste homem, afinal das contas de maternidades e óbitos], vendendo chapéus-de-chuva, pensos rápidos, a cais, o borda d'água, etc) para que ele tivesse de juntar o éme, o pê e o três e meter-lhe o leitor à frente; tive de sorrir quando passo e ele, vendo-me a olhar ponderando o negócio de 16 pilhas por um euro (caralho, que barato), sai-se com esta de dá para o rádio e para o leitor de mp3. Muita coisa muda com o tempo - o tempo perguntou ao tempo quando tempo o tempo tem, muito, o suficiente para que tu morras, eu morra, e o tempo se acabe e volte a nascer, e afinal o que são 16 milhões de anos, este conceito que eu nem sou capaz de compreender, de meter na cabeça sem ficar zonzo,  uma idade da Terra na qual nem dinossáurios nem homem a habitavam,  toda esta imensidão de planeta dada aos pés e glândulas e mucosas e patas de outros bichos, não sei, deixa-me acabar a refeição em paz, que perguntas parvas.
2- mas, afinal de contas, que merda de cor foi esta para a qual se mudaram as letras deste blogue? que dor nos olhos porra.

Acordo Ortográfico

Será que no Acordo Ortográfico recentemente aprovado seis (6) significa zero (0)? É que se sim, então ganhámos ao Brasil 0-2! Se não, Queiroz, estás um bocado fodido, certo? Pelo menos os clientes das tascas desse país, se fossem o Madaíl, já te tinham mandado às couves. Se calhar, até são capazes de ter influência no Madaíl, o seu velho conhecido companheiro de copos. (O Ricardo e o Scolari devem estar a rebolar a rir… Se fosse eu, estava. Mas eu sou traquinas…)

sábado, novembro 15

Humanete II

Ao fazer uma pesquisa na internet, mais especificamente através de um popular motor de busca (que já se tornou verbo), da palavra “inovação,” foram encontrados 6.830.000 resultados. Fazendo a mesma busca com a expressão em inglês, “innovation,” foram encontrados 123.000.000 de resultados, cerca de 18 vezes maior que a anterior. Não sendo muito relevante para o assunto desta tese, é significativo o peso que a inovação tem nos dias que correm.

A febre de inovação não pára de subir: Magalhães, Projecto e-Escolas, formação de equipas de trabalho nas organizações, etc. Tudo serve de pretexto e de contributo para a inovação. O facto de a inovação introduzir algum grau de mudança (p.e. mudança de estratégia ou adição de um novo público-alvo) (Dougherty, 1999) favorece, por exemplo, até os candidatos presidências dos Estados Unidos da América, envergando o chavão da mudança e da inovação. Favorece também, num outro exemplo, a imagem de Portugal no panorama internacional. Quem não se lembra da oferta generosa que o Primeiro-ministro português José Sócrates fez, na Cimeira Ibero-Americana de 2008, em que “ofereceu computadores Magalhães aos Chefes de Estado e de Governo dos 22 países que participaram na XVIIII Cimeira Ibero-Americana, na capital de El Salvador” e que “a distribuição dos computadores Magalhães antecipou o anúncio de que o Governo português escolheu a Inovação e as Novas Tecnologias como temas da Cimeira Ibero-Americana de 2009, que será organizada por Portugal” tendo um resultado benéfico em termos de vendas, pois “depois da Venezuela ter assinado um contrato para a aquisição de um milhão de computadores, Portugal procura agora entrar nos mercados do Brasil, Chile e Argentina, países que já mostraram interesse no Magalhães. “ (http://ww1.rtp.pt/noticias/?article=370336&visual=26&tema=2) Apesar de não almejar ser um texto jornalístico, este excerto demonstra como a inovação serve para variados propósitos, como neste serve de estandarte de desenvolvimento e investimento por parte de um Estado.

A palavra entrou na linguagem do dia-a-dia, sendo aplicada correctamente em alguns contextos, mas noutros é utilizada abusivamente. Exemplo disso é o facto de surgir, como acontece em algumas organizações, como uma espécie de Santo Graal que resolverá todas os problemas inerentes com o clima de incerteza que se vive. Não há problema em prometer “inovação”. A questão reside na vacuidade da promessa, ou seja, o Graal costuma estar vazio.

Outra questão inerente à utilização da expressão “inovação” é a limitação do conceito. Quando se escolheram os temas para a Dissertação de Mestrado Integrado, colegas da mesma secção e de outras secções e “credos psicológicos”, na sua curiosidade natural (e também com intenções de benchmarking), perguntavam qual o tema da tese e qual o orientador que tinha escolhido. Respondia sempre da mesma forma: “Inovação, mais especificamente, Clima para a Inovação”. Foram raros os casos em que não obtive uma resposta/pergunta relacionada com o facto de ir estudar as Novas Tecnologias ou as Tecnologias de Informação. O mesmo aconteceu com familiares e amigos fora da faculdade. E acontece com as pessoas em geral. Aproveitando o que foi escrito acima, o facto de a Inovação e as Novas Tecnologias terem sido a escolha do Governo Português como temas da Cimeira Ibero-Americana de 2009 pode influenciar, em parte, a confusão entre Inovação e Novas Tecnologias. As Novas Tecnologias fazem parte da Inovação, mas nem toda a Inovação é da esfera das Novas Tecnologias. Inovação pode manifestar-se através de uma obra de engenharia grandiosa, como por exemplo, o Estádio Olímpico de Pequim (ou Beijing, consoante os gostos), mais conhecido como Ninho de Pássaro. Pode manifestar-se também nas coisas mais simples, como por exemplo, utilizar um clip de escritório para resolver o problema da lapiseira que está estragada e que recolhe as minas ao escrever.

A Inovação está na moda. Na publicidade também é referida. Um produto que surja tem de ser inovador. Seja o design, seja o material de que é feito, seja o fim para o qual se vai utilizar, seja qualquer coisa. Terá de ser inovador. Exemplos disso são máquinas de barbear com cada vez mais lâminas, revestidas com uma liga metálica hipoalergénica, com uma pega ergonómica e com dezenas de patentes registadas num objecto quase insignificante que cabe na palma da mão e que ao fim de um tempo de utilização vai para o lixo. Outro exemplo é a cerveja, cujas marcas utilizam fórmulas artesanais, inventam novos sabores para adicionar à cerveja, introduzem novos designs de garrafas. Um dos últimos exemplos neste campo é um conceito que não sou o único a estranhar: cerveja de pressão engarrafada. Conceito inovador, embora estranho. Estas inovações em produtos são altamente publicitados, servindo de estandartes de desenvolvimento, obrigando concorrentes a desenvolverem novos produtos concorrentes, ou seja, a inovarem também eles.

sábado, novembro 8

ó magalhães, quem são as tuas mães

enfim, façamos todos o que pudermos uns pelos outros e essa será a melhor forma de evitar as finanças.

sexta-feira, novembro 7

Um abismo obscuro e viscoso, um poço que não se usa na superfície do mundo

Não sei quantas almas tenho.

Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem acabei.

De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,

Torno-me eles e não eu.

Cada meu sonho ou desejo

É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem;

Assisto à minha passagem,

Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo

Como páginas, meu ser.

O que segue não prevendo,

O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li

O que julguei que senti.

Releio e digo: "Fui eu?"

Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

quinta-feira, outubro 30

Declarações médicas de quê?

Não pude evitar... Para os interessados! http://atuleirus.weblog.com.pt/arquivo/2006/12/zeze_estupido_c

quarta-feira, outubro 29

Aquilo

Eu acho que é de estar um bocado só… Entortado por pensares que me apresentam a mim mesmo como um fruto da mais profunda desilusão, do lento pesar do insucesso. Na minha vida, de tempos a tempos, sinto-me mais só que o normal e, quando isso acontece, quando essa espécie de carência me enfraquece até ao limiar da vulgaridade, tendo a procurar pessoas, caras estranhas que me encantam por assim serem, vê-las, mesmo que com elas palavra não troque ou olhar partilhe. Percorro as ruas movimentadas onde se escuta o peculiar trote da misteriosa essência humana, as desertas vigiadas por alguém que deixa a luz acesa até muito tarde, perscruto os passos apressados, o silêncio dos gatos, o zunir eléctrico de qualquer avaria ou o vento a embater em objectos degradados que jazem no subconsciente da urbe. Nestas alturas de vulgar solidão, de banal necessidade, evito ir para casa… Podem já todos ter recolhido, eu, necessito continuar a adiar o retorno para o isolamento total: cego a estímulos, que não me deixa alternativa àquela meditação que surge sem que eu a solicite e que me auditoria as deliberações pouco convictas e os actos recentes ou de sempre. … é um aperto no estômago, leve picada que me quer manter ao frio, uma raivazinha, a discreta gota de urina que fica no tampo da sanita… se for para casa, perco a estúpida esperança de falar, contigo, com ele, com uma estranha qualquer com ideias megalómanas cheias de grandiloquência. Ao estar pela rua, existem possibilidades, existe aquele grito agudo, que se ouve ao fundo do túnel, assombroso, encantador. Sei-o, sinto-o, numa rua da cidade, cirandando, desesperando, vomitando ou esperando por mim, está algo que eu devo procurar… Às vezes desisto, entro no carro e meto-me a caminho de casa, mas paro nas estações de serviço e olho para as gentes a comprar tabaco, com roupa de quem veio da discoteca; paro à beira da marginal para olhar o mar revolto e o incognoscível areal; detenho-me debaixo do céu para olhar as estrelas e com sorte, umas gotas de chuva; fico no meio da serra, fixando o olhar nos brilhantes olhos de uma raposa. Pode acontecer qualquer coisa em qualquer um desses sítios - eu desejo tanto que assim seja - a maior improbabilidade de todas e, quando acordar no dia seguinte ou até, no dia depois desse, poderei deixar de me sentir incompleto e sorrir com aquele ar de satisfação e realização, mesmo sabendo da efemeridade da sensação…

segunda-feira, outubro 27

toma lá...

Temos memórias que permanecem mais ou menos intactas, depende também da teoria, corrente ou meta qualquer coisa a que recorramos para decidir acerca da perenidade das memórias. Mas tenho uma dentro de mim que parece ocupar uma parte inteira do cérebro, parece que metade do espaço dedicado a memórias é para ela, tendo as outras que competir por um nada cativo lugar na metade sobejante. Correm os dias e lá está ela, no seu amplo T4, vagueando completamente nua pelo soalho flutuante. Pega numa refeição rápida e, entretida, olha para o mundo através dos meus olhos, o que dá azo a que se masturbe várias vezes. Podia dizer que era como viver com um bicho dentro de mim, contudo, não me incomoda, não me revolta, não me dá pesadelos nem suores frios, apenas ocupa espaço e está constantemente no meu consciente. Querem saber que memória é essa? É uma coisa que aqui há uns anos atrás, poderia dizer que para além de a mim próprio, não havia contado a ninguém, contudo, já não é assim. Às vezes contamos coisas às pessoas porque confiamos nelas ou então, em nós próprios. É uma coisa tipo, toma lá um pedaço da minha intimidade, porque mereces, eu amo-te e quero dar-to, depois, tudo muda e aquele pedaço não é mais que um naco de excremento que a outra pessoa tem de, obsequiosamente, guardar na memória.

Et il pleut

As nuvens passam ao longe colam e descolam, os contornos dos prédios são rijos e imóveis escuros, acomodam-se uns aos outros para se manterem de pé, 500 anos não os arrancam. Sente-se o fresco dos, e das gotas que caem nos pés. Estrelas de vidro 30, 40, 60 voltes quadradas ou clarabóias. Os gigantes luminosos comem-te o sossego com o seu silêncio, movem-se com a terra. Ouves os cometas a desfazer-se na atmosfera alguns parecem ar num copo. Gostava de sentir o pânico dos cabos eléctricos a explodirem de energia e matar uma noite, mumificar uma floresta e cobrir-me de musgo e esperar, e esperar a ver a terra vermelha desbotar e no fim ver Vénus a rir-se para um búzio e um homem sem pés. Mas no entanto não há osgas neste mundo. Fermé le fenêtre

sábado, outubro 25

girl power o caralho

Os homens meditam bastante na razão das coisas: porque é que o mundo funciona como funciona; que mecanismos obscuros o fazem girar; porque são as pessoas assim ou assado; o que torna as relações complicadas, incogniscíveis mas necessárias; como é que ainda ninguém espetou um balázio no sócrates; é possível alguém alimentar-se somente de bacalhau durante um mês; etc.
Que eu saiba, raras eram as mulheres que partiam para as serranias para meditar nestes e noutros mais graves assuntos. Eu pelo menos nunca ouvi falar de mulheres eremitas. Essa falta de afastamento, a incapacidade de se fartarem da sociedade não pode ser só atribuído à pérfida influência de sociedades com valores machistas ou masculinizados pois não; eu respondo dois pontos não.
O que eu quero dizer é que só pode estar geneticamente determinado que os homens passem mais tempo a moer a cabeça com inutilidades. Não há nada a fazer, estamos distraídos por uns momentos e começamos logo a pensar em regimens fascistas ou a cura para o cancro, ou como arranjar os carretos da bicicleta. Há uma teoria por desenvolver,na qual se venha a provar que, de facto, os homens morrem mais cedo porque ficam todos fodidos de anos e anos de que intensos trabalhos mentais. Por outro lado, em relação à parte física, toda a gente sabe ou intui que, se um homem for fazer queda livre, fá-lo [falo] meramente porque tem a vitória (uma gaja gira que conheceu há cerca de um mês numa festa da empresa) cá em baixo à sua espera, humedecendo as beiças tumefactas enquanto pensa, meu deus, se o Custódio salta assim daquele avião, imagino o que ele não fará comigo depois do jantar. 
ui, vamos fazer figas pelo Custódio;
roarrrr!

sexta-feira, outubro 10

MD

Amigos? Claro que tenho amigos! Amigos, produtos da mais cerrada miséria humana, amigos que se revelam amiúde, por entre esquinas e paredes envelhecidas da cidade decrépita que parece respirar com muita dificuldade, num arfar doloroso que nas entrelinhas clama pelo suicídio. Os amigos não estão lá sempre, por vezes fundem-se na celeuma urbana e são preciso mil centelhas de qualquer coisa para que eles apareçam. Um cão cheio do sarro da noite, pode ser meu amigo, tal como o alcoólico que aperta com a sua garganta toda aquela depressão que com a bebida se tornou miudinha e quase incognoscível. Pergunta-me se é deprimente. Que lhe digo eu, sob este véu escuro e cheio de um húmus infértil, que lhe respondo eu do alto deste meu ferro-velho mental, deste esgoto idiossincrático que só é capaz de debitar o horrendo, o ardil do veneno da madrugada? Como se eu fosse a água da sua azenha, procura mais certezas, confirmações, para juntar às nenhumas que já tem. Quer saber se é o cão ou o bêbado, mas, quer saber muito mais, quer saber se a sua vida tem fundamento, quer saber se o amor que não sente, a paixão que não lhe toca, se tudo isso são coisas normais e eu, eu sinto-me mal, sinto-me um bruxo cego a coisas de adivinhos, não sei que lhe diga, não sei se ele vai bem, se está mal e se se desgraça a cada lufada de ar que com o seu corpo torpe e obeso absorve. Faz que não me ouves, faz isso mesmo, se me ouvires segues para caminhos cheios de viço aparente que sob a luz certa, são apenas sinal de uma ímpia devastação onde o opróbrio cobre de lés a lés. Sei do mal-estar que te vai corroendo as entranhas regaladas com toda a comida boa que consomes sem dó nem piedade de ti mesmo, sei, sim… sei que faças o que fizeres, por menor a dignidade que esbanjes por aí, dentro da tua economia de filantropismo e magnificência, por menos asceta e mais meliante que sejas, lá estarei para te escutar, para me irritar com os teus comportamentos mesquinhos e observações inúteis que me fazem suspirar e desejar ter qualquer objecto cortante com que te desmembrar, mas, lá estarei, para te tolerar, ser tolerado, aconteça o que acontecer.

quinta-feira, outubro 9

You thought it was the start of something beautiful?

OBRIGADO A TODOS pelo bilhete, foi o melhor concerto a que alguma vez fui.

Para Nós

"A cada passo se formam por aí grupos literários. Há-os em todas as gerações. Os rapazes sentiram sempre necessidade de comunicar e juntam-se conforme o acaso, as afinidades ou aspirações.
É um momento delicioso que nos deixa para sempre um nada de poeira no fundo da alma - algum pó dourado que teima em reluzir até ao fim da vida. Já o passado fica muito longe, já as figuras de apagadas mal se distinguem e ainda a poeira de sonho teima lá no fundo... É que essas horas são como a primeira flor das árvores: não há nada que as pague. Por melhores e mais conscientes amizades que mais tarde se adquiram, nenhuma chega à dos vinte anos, quando o homem não tem interesses a defender e os sentimentos estão em pleno viço. Não há um de nós que saiba ainda o que vale a existência e todos de mãos dadas a olhamos com sofreguidão e candura. É o começo delicioso de uma aventura. Estamos juntos e unidos como irmãos e já sentimos o travor da separação: só mais um passo e cada um parte para o seu lado, sem às vezes se tornar a ver."
Raul Brandão.

segunda-feira, outubro 6

anne

é uma estupidez que as palavras que ficam por ser são muito mais importantes do que as palavras que já são.

sábado, outubro 4

"Estamos a viver numa crise de valores"

- ‘Tão mas conta-me lá, tu já não comes carne?

- Não.

- Mas… Como é que isso é possível, man…

- Pá, é possível. Porquê? Tu precisas de comer carne todos os dias?

- Yah, eu como carne todos os dias.

- Pá, yah… Mas a cena é que um gajo se vai habituando.

- Pá, fodasse, não consigo… Como é que é possível não comer carne?

- Pá, há a soja, e merdas assim que são tipo carne.

- Mas porque é que não comes carne? Dá-te pena do animal, é?

- Claro, man.

- Então e ovos e leite?

- Ah, isso ainda como.

- Fodasse, comes ovos e leite e não comes a vaca?

- Não man…

- Fodasse… Mas o animal é para matar! É natural! Um gajo tem de comer.

- Yah, mas tens outras coisas para comer, tipo soja…

- Fodasse… Mas tu viraste à esquerda?

- Yah, bué.

- Tipo, esquerda mesmo esquerda?

- Yah, mesmo bué esquerda.

- Tipo anarquismo?

- Isso mesmo.

- Fodasse… Então votas no quê?

- Não voto, voto nulo.

- Fodasse… Então não me digas que és contra as touradas também?

- Yah, claro! Sempre fui.

- E essa merda do vegetal e do anarquismo quando é que começou? Fodasse…

- Pá, sempre fui um bocado. Não foi de um dia para o outro, foi acontecendo.

- Então mas não comes carne há quanto tempo?

- Desde Janeiro.

- Fodasse… O que é que fizeste a ti, caralho.

- Pá, são opções.

- Yah, na boa.

- Yah.

- Mas tu não votas mesmo?

- Não, man.

- Então no que é que acreditas?

- Pá, acredito que o homem pode ser responsável.

- Responsável como? Não precisa de autoridade?

- Não, man. Tem de ser responsável por si próprio.

- Fodasse, então e não há polícia, é?

- Yah, o homem não pode ser reprimido.

- Então, mas assim era o caos… Podias matar à vontade!

- Não man, se tu és responsável, se tens moral, não vais matar, vais deixar os outros viver. Ou se fosse permitido tu matavas?

- Yah, se calhar sim!

- Matavas?

- Pá, se fosse preciso.

- Então não tens moral.

- Yah, eu tenho e sei que é mal matar, mas diz lá isso a um gajo das favelas… se não matar morre ele.

- Pá, yah, mas supostamente, o homem tem de se tornar responsável, sem precisar de autoridade.

- Fodasse, não me fodas!

- Pá yah, é assim…

- Olha, dá-me aí um cigarro… Os meus já acabaram e não fumo Davidoff há bués.

- Yah, yah, tira man.

- Obrigado.

- Na boa.

- Yah, eu quando tive na polónia, tive numa residência com duas gajas que são essa merda que tu és… pá e elas falaram-me uma beca naquilo.

- Yah…

- Fodasse, mas não me faz sentido, caralho. Comer carne é bué importante man. E tu comes ovos e leite.

- Yah, mas até fumar é uma hipocrisia minha.

-Porquê?

- Porque o tabaco é feito com gelatinas animais e…

- Fodasse, não me fodas!

- Yah.

- Pó caralho. Agora também vais deixar de fumar?

- Yah, tem de ser.

- Fodasse, o que é que fizeste contigo…

quinta-feira, outubro 2

look what you started

porque eu tenho uma albergaria no alentejo!
era isto o que uma imbecil de merda gritava a um empregado de mesa - porque este não tinha trazido outra chávena para pôr chá. A coisa passou-se da seguinte maneira: eu e uma amiga, um café numa dessas avenidas novas. Os dois indecisos entre doce ou salgado, croquete ou brownie, tosta mista ou croissant, ah, não há croissant com chocolate, então croissant com fiambre pode ser, não não, não há mesmo a categoria pasteleira de croissant de momento neste café. Nesse caso, uma andria para mim, galão. tosta mista para mim, sumo de laranja amarguíssimo, degustou ela depois. Chega o pedido e ouve-se a duas mesas de nós, da boca de um mulher que eu até tinha achado querida por estar a tirar uma ramela, ou semelhante categoria pasteleira, ao seu home, dizia, ouve-se o seguinte: você como é que se chama, rafael, ah, rafael, faz favor de me trazer outra chávena de chá (chávenas bojudas, alvas, reluzentes de porcelana, finas, apropriadas para chocapic talvez, não para chá, diria a minha mãe que gosta da chávenas de chá delicadas). 
O Rafael, que era brasileiro e parecia ter a rapidez mental semelhante ao trânsito na segunda circular por roda das seis da tarde, não percebeu a questão, a ordem, porque aquilo foi dado em tom de ordem. Não sabia ele a besta de merda com que estava a lidar, sabendo, tinha ficado nas amazónicas terras onde deixou a tez morena e saudável para adoptar aquele esverdeado sobre os olhos e crivos de borbulhas na testa. Lisboa faz muita coisa a muita gente mas, grosso modo, faz olheiras primeiro.  A conversa fica desagradável e ácida no tom, eu estava a tentar contar qualquer coisa à laura mas não conseguia concentrar-me; só se ouvia aquela imbecil de merda com uma arrogância que merecia ser cortada à faca. Meti o dedo indicador direito no ouvido do mesmo lado e continuei. Quando tiro o dedo, mercê de terminado o meu monólogo sobre amor e namoradas e a diferença entre homens e mulheres, ouço a imbecil de merda, vá chamar o seu gerente já. Ele lá vem outro brasileiro, bla bla a coisa continua, e ela, da baixeza da sua nobreza diz eu tenho uma albergaria no alentejo, e um restaurante; e eu juro que só me apetecia bater-lhe. Mas bater-lhe com muita força. O estúpido do marido, um pouco vesgo, que devia era ter tido mãos para calar a mulher, meter-lhe uma chapada na cara, apalpar-lhe as pernas e a cona, ou shhh querida, pronto; nada. Quedou-se, como se fora nada com ele. Apetecia-me bater nos dois. Com força, justificando todos os movimentos de libertação operária, indo buscar força a todos os cretinos que vão em manada protestar contra o governodespótico, bater-lhes sem piedade, arrancar-lhes os cabelos e enfiar a cara da mulher debaixo do meu sovaco enquanto lhe daria carolos dizendo és três vezes estúpida, pensas que só porque estás a pagar tens o direito de maltratar as pessoas que te servem? Sabes o que é que vais servir nesse teu restaurante como prato do dia na próxima segunda semana, quando não houver cação ou outro peixe? os teus rins ensopados no teu sangue.
bem, isto está um pouco violento. De qualquer forma, o moral desta estória é: como é possível? como é possível que estes engravatados de caca, supostamente senhores de si, controladores dos seus impulsos devido à educação que tiveram, deixarem levar-se neste esculachar, se permitam a maltratar alguém só porque essa pessoa tem um estatuto social económico racial, o que quer que seja, diferente do seu pá.
Foda-se!

Ying Yang

...partiste por nada, ou talvez tenhas partido por qualquer coisa que está atrás dos meus olhos. A realidade é que não te encontras.

Às vezes, ensonado e em transição, começo a perder-me ou talvez a encontrar-me; sinto-me mesmo a sério, mas sinto-me cirandante em torno de mim próprio, um conjunto etéreo de partículas que deixam um inverosímil rastro. Novos pensamentos emergem da minha sombra, seguem-se uns aos outros ou então é sempre o mesmo, passa rápido por esta coisa que é o meu alcance e eu não lhe consigo prestar suficiente atenção para o descodificar, mas, esforço-me bastante; repete-se, lateja na minha cabeça sem que eu o possa entender.

Sinto que não devo parar o carro. Paro o carro porque tenho mesmo de parar. Vejo matéria orgânica trespassada à beira da estrada, matéria que está a sentir no máximo das rotações do sentimento, matéria que quase rebenta de tanto sentir. Eu sinto o seu sentimento e tiro as mãos dos bolsos para o apalpar, faço-o sem grandes problemas e ao largá-lo, fico com uma perene gosma nas minhas mãos. A matéria está dividida. Alguém grita «...CAÍU DE MOTA, CAÍU E IA MUITO DEPRESSA, MEU DEUS, MEU DEUS, AJUDE-O», aposto que iria espernear bastante se ainda tivesse uma perna que fosse, aposto que deseja a morte e mais que um desejo apenas, sente esse desejo na sua própria organicidade, sem qualquer somatização ou delírio psicotrópico. Está tão lúcido, grita tão alto...

«ah, vinha muito depressa, a culpa é dele», diz um senhor pouco importunado ou nauseado pelo cenário dantesco, diz um senhor com um olhar brilhante e uma postura espartana... Não esperava aquilo ali num contexto tão específico. O homem após ter condenado o enfermo que está no pique da sua vida (nunca foi tão intensa), apronta-se a abeirar-se dele e a consolá-lo de uma forma pouco assertiva, mas, é o único que se abeira dele e lhe toca e diz coisas como «vês, é por isto que não se deve andar por aí à maluca, já viste...». Ali, naquele curto espaço e marcado por poças de sangue, vi a união daquele que sente ao máximo e o que nada sente, a união entre a vida e a morte...

domingo, setembro 28

Pérolas esquecidas...

Desafio: qual o vosso primeiro pensamento que vos vem à consciencia com esta imagem? Para mim foi "que drogas andava este senhor a tomar nos anos 70? Será que ainda sai à rua?"

sábado, setembro 27

Diarreia

Sempre pensei que a diarreia fosse uma coisa congeminada pelo nosso estômago e intestinos, que ruminavam durante horas até decidirem expelir aquilo que nós sabemos. Mas afinal, existem diarreias instantâneas.

sexta-feira, setembro 26

Jesus...

Cada vez mais, os jovens do mundo desistem da religião e embraçam outros sistemas de crença. Uns contentam-se com o ateísmo, para não se chatearem, outros com o satanismo, pois a adopção de um sistema antagónico ao vigente não quer dizer nada a não ser “ah e tal, eu já fui sacristão, mas o padre embebedava-se e molestava-me, com hóstias nos mamilos.

Outros deixam de acreditar por isto que vem a seguir.

Depois deste vídeo, todos vão ficar a cantarolar a sua melodia melacenta e, por consequência, adoptar Jesus como seu “amigo”. E não, não estou a falar do espanhol que veio agora de Erasmus, chamado Jesus, oriundo de Badajoz, e de ascendência cigana.