quinta-feira, outubro 2

Ying Yang

...partiste por nada, ou talvez tenhas partido por qualquer coisa que está atrás dos meus olhos. A realidade é que não te encontras.

Às vezes, ensonado e em transição, começo a perder-me ou talvez a encontrar-me; sinto-me mesmo a sério, mas sinto-me cirandante em torno de mim próprio, um conjunto etéreo de partículas que deixam um inverosímil rastro. Novos pensamentos emergem da minha sombra, seguem-se uns aos outros ou então é sempre o mesmo, passa rápido por esta coisa que é o meu alcance e eu não lhe consigo prestar suficiente atenção para o descodificar, mas, esforço-me bastante; repete-se, lateja na minha cabeça sem que eu o possa entender.

Sinto que não devo parar o carro. Paro o carro porque tenho mesmo de parar. Vejo matéria orgânica trespassada à beira da estrada, matéria que está a sentir no máximo das rotações do sentimento, matéria que quase rebenta de tanto sentir. Eu sinto o seu sentimento e tiro as mãos dos bolsos para o apalpar, faço-o sem grandes problemas e ao largá-lo, fico com uma perene gosma nas minhas mãos. A matéria está dividida. Alguém grita «...CAÍU DE MOTA, CAÍU E IA MUITO DEPRESSA, MEU DEUS, MEU DEUS, AJUDE-O», aposto que iria espernear bastante se ainda tivesse uma perna que fosse, aposto que deseja a morte e mais que um desejo apenas, sente esse desejo na sua própria organicidade, sem qualquer somatização ou delírio psicotrópico. Está tão lúcido, grita tão alto...

«ah, vinha muito depressa, a culpa é dele», diz um senhor pouco importunado ou nauseado pelo cenário dantesco, diz um senhor com um olhar brilhante e uma postura espartana... Não esperava aquilo ali num contexto tão específico. O homem após ter condenado o enfermo que está no pique da sua vida (nunca foi tão intensa), apronta-se a abeirar-se dele e a consolá-lo de uma forma pouco assertiva, mas, é o único que se abeira dele e lhe toca e diz coisas como «vês, é por isto que não se deve andar por aí à maluca, já viste...». Ali, naquele curto espaço e marcado por poças de sangue, vi a união daquele que sente ao máximo e o que nada sente, a união entre a vida e a morte...

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