terça-feira, novembro 3

Pateta

Há uns minutos atrás, um colega meu, após uma conversa aparentemente despropositada sobre a sua necessidade de perder peso, revelou-me o acto recente que havia ingenuamente cometido. Tinha, com os seus olhos vivos e sequiosos de beleza feminina, reparado numa rapariga, pelos vistos atraente e a mesma, por um daqueles semi-acasos do destino, sentou-se perto dele. Ele, galante e esquecendo a representação mental de si próprio, foi ter com a tipa de botas até aos joelhos e muito educadamente disse-lhe que a achava "muito gira" e perguntou-lhe se podia saber o seu nome. Ela respondeu negativamente e ele foi-se embora para desespero de todo o sangue que havia entretanto sido chamado à genitália.
Ao saber de tudo isto e apesar de me doerem as costas, elogiei-o o mais que consegui, gabei-o, admirei-o duma forma que apesar de dever muito à sinceridade, pareceu, certamente, verosímil. Disse-lhe que assim é que devíamos todos ser, não devíamos deixar que tudo nos limitasse, qualquer coisa nos pusesse limites. Porque raio haveria ele de conhecer apenas os colegas de aulas ou de trabalho, os familiares ou amigos de amigos? Disse-lhe que ele devia tratar do seu próprio destino e rir-se dessas subtis conspirações que nos limitam até ao tutano. Ele abriu um pouco aquele ar apatetado que tinha, deixou o sorriso doente e os olhos de tristeza abissal recuperaram uma vitalidade para lá daquela que apenas nos dá forças para nos dirigirmos ao precípicio. Animou-se um pouco, por uns instantes. A animação não durou muito tempo e eu senti que os elogios que eu fazia, a admiração que fingia sentir, estava a perder o efeito, a esvair-se por entre as palavras ocas que proferia. Foi-se embora, não suportou a rejeição apesar de concordar comigo quando eu lhe insinuo que se ela lhe dissesse o nome, conseguiria exactamente o mesmo; sente-se mal e passa de uma pessoa muito alegre e extrovertida para um farrapo humano que até mete dó. Foi-se embora cabisbaixo, argumentando que ia estudar. Dedicar-se aos estudos para esquecer, penso eu, porque na realidade, não se conseguirá concentrar na matéria e o neurótico arrependimento por ter tomado tão bravia acção, irá consumi-lo nas próximas semanas. Será que ele morreu, será que vai mudar e deixar de ser o mesmo tipo extrovertido, alegre e apatetado?

1 comentário:

insatisfeitadamesse disse...

Desculpa o comentário, mas não resisti. Respondendo às últimas questões: ainda acreditas em milagres??? (espero que fossem meramente retóricas)