quinta-feira, outubro 30
Declarações médicas de quê?
quarta-feira, outubro 29
Aquilo
segunda-feira, outubro 27
toma lá...
Et il pleut
sábado, outubro 25
girl power o caralho
sexta-feira, outubro 10
MD
quinta-feira, outubro 9
You thought it was the start of something beautiful?
Para Nós
segunda-feira, outubro 6
sábado, outubro 4
"Estamos a viver numa crise de valores"
- ‘Tão mas conta-me lá, tu já não comes carne?
- Não.
- Mas… Como é que isso é possível, man…
- Pá, é possível. Porquê? Tu precisas de comer carne todos os dias?
- Yah, eu como carne todos os dias.
- Pá, yah… Mas a cena é que um gajo se vai habituando.
- Pá, fodasse, não consigo… Como é que é possível não comer carne?
- Pá, há a soja, e merdas assim que são tipo carne.
- Mas porque é que não comes carne? Dá-te pena do animal, é?
- Claro, man.
- Então e ovos e leite?
- Ah, isso ainda como.
- Fodasse, comes ovos e leite e não comes a vaca?
- Não man…
- Fodasse… Mas o animal é para matar! É natural! Um gajo tem de comer.
- Yah, mas tens outras coisas para comer, tipo soja…
- Fodasse… Mas tu viraste à esquerda?
- Yah, bué.
- Tipo, esquerda mesmo esquerda?
- Yah, mesmo bué esquerda.
- Tipo anarquismo?
- Isso mesmo.
- Fodasse… Então votas no quê?
- Não voto, voto nulo.
- Fodasse… Então não me digas que és contra as touradas também?
- Yah, claro! Sempre fui.
- E essa merda do vegetal e do anarquismo quando é que começou? Fodasse…
- Pá, sempre fui um bocado. Não foi de um dia para o outro, foi acontecendo.
- Então mas não comes carne há quanto tempo?
- Desde Janeiro.
- Fodasse… O que é que fizeste a ti, caralho.
- Pá, são opções.
- Yah, na boa.
- Yah.
- Mas tu não votas mesmo?
- Não, man.
- Então no que é que acreditas?
- Pá, acredito que o homem pode ser responsável.
- Responsável como? Não precisa de autoridade?
- Não, man. Tem de ser responsável por si próprio.
- Fodasse, então e não há polícia, é?
- Yah, o homem não pode ser reprimido.
- Então, mas assim era o caos… Podias matar à vontade!
- Não man, se tu és responsável, se tens moral, não vais matar, vais deixar os outros viver. Ou se fosse permitido tu matavas?
- Yah, se calhar sim!
- Matavas?
- Pá, se fosse preciso.
- Então não tens moral.
- Yah, eu tenho e sei que é mal matar, mas diz lá isso a um gajo das favelas… se não matar morre ele.
- Pá, yah, mas supostamente, o homem tem de se tornar responsável, sem precisar de autoridade.
- Fodasse, não me fodas!
- Pá yah, é assim…
- Olha, dá-me aí um cigarro… Os meus já acabaram e não fumo Davidoff há bués.
- Yah, yah, tira man.
- Obrigado.
- Na boa.
- Yah, eu quando tive na polónia, tive numa residência com duas gajas que são essa merda que tu és… pá e elas falaram-me uma beca naquilo.
- Yah…
- Fodasse, mas não me faz sentido, caralho. Comer carne é bué importante man. E tu comes ovos e leite.
- Yah, mas até fumar é uma hipocrisia minha.
-Porquê?
- Porque o tabaco é feito com gelatinas animais e…
- Fodasse, não me fodas!
- Yah.
- Pó caralho. Agora também vais deixar de fumar?
- Yah, tem de ser.
- Fodasse, o que é que fizeste contigo…
quinta-feira, outubro 2
look what you started
Ying Yang
...partiste por nada, ou talvez tenhas partido por qualquer coisa que está atrás dos meus olhos. A realidade é que não te encontras.
Às vezes, ensonado e em transição, começo a perder-me ou talvez a encontrar-me; sinto-me mesmo a sério, mas sinto-me cirandante em torno de mim próprio, um conjunto etéreo de partículas que deixam um inverosímil rastro. Novos pensamentos emergem da minha sombra, seguem-se uns aos outros ou então é sempre o mesmo, passa rápido por esta coisa que é o meu alcance e eu não lhe consigo prestar suficiente atenção para o descodificar, mas, esforço-me bastante; repete-se, lateja na minha cabeça sem que eu o possa entender.
Sinto que não devo parar o carro. Paro o carro porque tenho mesmo de parar. Vejo matéria orgânica trespassada à beira da estrada, matéria que está a sentir no máximo das rotações do sentimento, matéria que quase rebenta de tanto sentir. Eu sinto o seu sentimento e tiro as mãos dos bolsos para o apalpar, faço-o sem grandes problemas e ao largá-lo, fico com uma perene gosma nas minhas mãos. A matéria está dividida. Alguém grita «...CAÍU DE MOTA, CAÍU E IA MUITO DEPRESSA, MEU DEUS, MEU DEUS, AJUDE-O», aposto que iria espernear bastante se ainda tivesse uma perna que fosse, aposto que deseja a morte e mais que um desejo apenas, sente esse desejo na sua própria organicidade, sem qualquer somatização ou delírio psicotrópico. Está tão lúcido, grita tão alto...
«ah, vinha muito depressa, a culpa é dele», diz um senhor pouco importunado ou nauseado pelo cenário dantesco, diz um senhor com um olhar brilhante e uma postura espartana... Não esperava aquilo ali num contexto tão específico. O homem após ter condenado o enfermo que está no pique da sua vida (nunca foi tão intensa), apronta-se a abeirar-se dele e a consolá-lo de uma forma pouco assertiva, mas, é o único que se abeira dele e lhe toca e diz coisas como «vês, é por isto que não se deve andar por aí à maluca, já viste...». Ali, naquele curto espaço e marcado por poças de sangue, vi a união daquele que sente ao máximo e o que nada sente, a união entre a vida e a morte...