terça-feira, dezembro 7
segunda-feira, dezembro 6
sexta-feira, dezembro 3
Deixemo-nos andar.
sábado, novembro 27
sexta-feira, novembro 19
Lei
quarta-feira, novembro 17
quarta-feira, novembro 10
do Avesso
sábado, novembro 6
Animal
Somos irmãos
segunda-feira, novembro 1
Auto violação
domingo, outubro 24
O Desejo Anal, ó jovem idade!, em Oliveira do Hospital
quinta-feira, setembro 30
Apenas mais uma história para o seguinte.
segunda-feira, setembro 27
Coimbra
quarta-feira, setembro 8
Uma breve história sobre o tempo
terça-feira, julho 20
sábado, junho 26
Pela noite dentro... (não ler antes do anterior)
Da minha janela.
sexta-feira, junho 25
Todos somos potenciais ditadores
segunda-feira, junho 14
Esta Madrugada
domingo, junho 6
Mais um dia
domingo, maio 23
Receptáculo
segunda-feira, maio 10
Papa aqui
terça-feira, maio 4
sexta-feira, abril 23
quinta-feira, abril 22
leitura 4 ou quotidiano
leitura 3 ou identidade
terça-feira, abril 20
quarta-feira, abril 14
leitura 2 ou missão
leitura 1 ou memória constructiva
sexta-feira, março 26
sexta-feira, fevereiro 26
CRETINA
Sei lá eu do medo. Quem me dera ter medo, uma coisa declarada, uma evidência empírica com correlato na sudação.
Apesar de todo o nervosismo que a insegurança gera, apesar dos receios e complexos nascidos num passado remoto, não obstante a falta da mínima confiança visceral ou lógica, a noite corria sem grandes surpresas, aparentemente, não havia uma novidade que fosse. Claro que ela não fez o jantar, alguma vez… bicos de pés, um pé 39 a bater no chão em forma de protesto, uma inclinação sob o balcão, um agachamento que faz algo em mim soltar um guincho de desespero tal é a visão… sim, partem de umas longas pernas e… que grandiosos glúteos encerram aquelas calças de pijama que estão muito justas e rotas num joelho, às quais ela dá outro nome (leggins?) – petulante volúpia, jovial pecado que cativa mas ao mesmo tempo, impõe o respeito de uma noite de gutural trovoada ou da entrada de uma magnânime catedral alicerçada em esqueletos e mentira humana. Medo? não, mas a distância e o desconforto miudinho são vibrações que em gente fraca e miserável, do calibre aqui do vosso reles autor, conseguem perturbar coisas há tanto tempo estáveis e cristalizadas. E o vosso autor… o vosso autor é feito de matéria que tem tanto de fraco como de lábil, o seu temperamento é volátil e não raras são as vezes em que o faz parecer um demente cheio de pretensão.
E foi no preciso momento em que a luz eléctrica foi preterida às velas que ela profere a seguinte frase que me tornou numa espécie de invertebrado pronto a esmagar: «…eu não te minto, mas omito imenso.» O silêncio reinou e a minha retina, enfim, sei lá eu o que aconteceu ao raio da retina; extinguiram-se os ruídos parasitas que da rua invadiam a sua casa pela janela aberta; olhei-a e o seu olhar que mantém sempre algo de alucinado, mais que provável metabolito de uma noite de drogas pesadas e memórias apagadas, indaga-me e é como se me perguntasse de forma agressiva: «algum problema com isso?» eu em silêncio tento articular qualquer coisa e aquele olhar continua a sugar-me o discernimento e a masculinidade.
Claro que há problemas com isso, claro que se tudo corresse bem, poderia ter um certo grau de relaxamento e enfrentar a infeliz confissão, agora assim neste decrépito estado de coisas, com esta humidade já bafienta… Se ao menos ela tivesse mentido e forçado um sorriso num momento oportuno, se houvesse ousado dizer que me achava belo ou pelo menos, parcialmente tragável, se me elogiasse o beijo, os dedos dos pés, se tivesse dito que gostava de mim ao invés de pedir com desesperada sofreguidão de quem se apercebe que não vai ter um orgasmo, para lhe chupar os lábios com mais força, ai sim, talvez eu descontraísse um pouco e conseguisse não ficar completamente atordoado por tamanha revelação. Mas medo, não.
Pela rua da politécnica vou apressado para o metro prestes a fechar, a chuva é miúda e refresca-me os calores forjados pela fricção do nervoso com o insucesso. Um pouco mais ao fundo vem uma tipa gorda de coxas gelatinosas, que corre durante um par de passos agitando a sua mala vermelha, depois, com um ar de atroz sofrimento, retoma o trote. Lá vou eu, ainda passo por uma espécie de festa na faculdade de Letras e ao invés da raiva habitual que nutro por quem vai a festas e grita no meio da rua sem ser por simples insanidade, sou complacente e penso algo como «estão a viver os melhores dias da sua existência», mas nem quero saber disso para nada.
Deito-me, decido sabotar a TV e fico um bocado triste por não teres convidado esta reles carcaça a dormir nem que fosse, no teu sofá. Mas medo? Não, não tenho medo.